Tenho notado por experiência própria e convivência com um
grupo bem heterogêneo de amigas que nós mulheres queremos, e nos cobramos, a
postura de Mulher Maravilha 100% do nosso tempo. Eu não sei de onde nós tiramos
essa ideia, mas eu garanto que muitas de nós acreditamos que precisamos
resolver tudo, o tempo todo, na nossa vida profissional e, acima de tudo na
nossa vida pessoal. Precisamos ser
praticamente perfeitas e nessa sociedade moderna de “direitos iguais” que vivemos,
nosso papel continua sendo extremamente, digamos, abrangente. Não atender às
expectativas que colocamos para nós, muitas vezes, é frustrante.
Trabalhamos tanto ou mais do que muitos marmanjos. E se você
trabalha em uma corporação pelo menos um pouco exigente com o dress code, seu
guarda roupas não pode se restringir a calças pretas e camisas brancas, a não
ser que esse seja o seu uniforme mesmo. Nossa jornada de trabalho, muitas
vezes, passa das 10h diárias (a minha muitas vezes passa das 12h). Mesmo amando
o que eu faço, confesso que é cansativo porque eu saio do meu trabalho e ainda
vou treinar. Não porque acredito no mito do corpo perfeito (se um cara quiser
apenas um par de coxas ou uma barriguinha sem as “alças do amor”, realmente me
assumo eternamente fora do target, mesmo se eu tiver um belo par de coxas e uma
barriga chapada), mas porque é a única hora do meu dia em que eu sinto que
estou realmente dedicando um tempo só pra mim, depois de resolver todos os
pepinos dos outros.
E sim, mesmo com um bando de homens repetindo em coro que
não precisamos ir ao salão, fazer a unha, depilar, cuidar do cabelo, da pele, que
mulher se arruma só para mulher, não conheço um cara que tenha orgulho de sair
com a Monga, com uma pessoa que só usa calça de moletom na rua ou com alguém
que tem sempre o esmalte lascado ou o pé grosso. É esperado sermos femininas,
lindas e cheirosas e eu pelo não acho isso ruim não. Taurina assumida que sou,
acho legal ser vaidosa, mas isso faz com que eu precise encaixar também essas
atividades na minha rotina.
Se moramos sozinhas, ainda chegamos e temos os afazeres de
casa. Sim, podemos ter faxineira e eu acho que esse é o melhor dinheiro gasto
da vida de uma mulher moderna, mas eu pelo menos não consigo ter uma diarista.
Então a louça acumula, a roupa embola no guarda roupa e nem sempre dá pra
esperar a próxima semana pra ligar o ferro. Tenho duas gatas que eu amo, mas
que me exigem minimamente atenção diária também. Sem contar minhas amigas, mãe,
meu pai, irmãs e o resto da família, que se dividem no meu final de semana
normalmente abarrotado de compromissos ou pendências pessoais que não resolvi
no meio da semana, uma vez que moro no Morumbi e trabalho em Guarulhos (oi?) e
dar uma “escapada” na hora do almoço nunca é uma opção para mim.
(Eu nem vou entrar no mérito do que acontece quando você tem
uma obra eterna na sua casa como eu tenho ou quando tem filhos. Eu realmente
admiro e bato palmas para vocês, minhas companheiras. Sério. Clap clap clap com
louvor).
O ponto aqui não é discutir direitos ou papeis de homens e
mulheres nessa bagunça toda que é nossa vida. Isso tudo ai em cima, muitas
vezes, não é um décimo do que algumas outras mulheres precisam fazer, bem como sei
que a rotina de muitos caras não é nada, nada, nada fácil achando ainda que
precisam ser machões o tempo todo. Não estou aqui idolatrando as mulheres ou crucificando
homens, mesmo porque, sou do grupo que acredita que SIM, nós precisamos deles
em nossa vida (feministas, podem me crucificar agora, beijos, não me liguem!)
Esse é só o contexto que coloquei para refletir exatamente
sobre o questionamento: com toda essa carga que carregamos, porque a gente
exige a capa da Mulher Maravilha 100% do tempo em situações em que poderíamos
retirá-la sem medo? Falo isso com toda a
propriedade porque até bem pouco tempo atrás, eu me recusava a retirar a minha.
Pelo meu estilo de vida, acabo dedicando grande parte do meu tempo para meu
trabalho. Há anos trabalho na área de Serviços e, na
maioria das vezes, preciso encontrar a solução de alguma bomba, e tomar
decisões que podem impactar todo o negócio. O ponto é que eu ia embora do
ambiente corporativo e continuava tentando organizar tudo da mesma forma na
minha vida pessoal.

Durante muitos anos eu vivi um relacionamento que fez com
que a minha capa praticamente grudasse em mim com cola Super Bonder: além de
todas as decisões difíceis do dia a dia, cabia a mim o papel de escolher o
restaurante, reservar mesa, chamar o garçom, fazer o pedido, decidir o filme do
cinema, o passeio do final de semana, chamar o carro no vallet, planejar a
viagem, a pousada, lembrar de pegar a grana do pedágio, de passar no
mercado para comprar o jantar que eu cozinharia, além de encarar a louça
sozinha depois.
(Nota de rodapé: isso aqui não é uma crítica, apenas a
constatação de um fato. Uma pessoa extremamente hands on e independente como eu
encontrou uma pessoa cuca fresca e sem muita atitude porque não precisava ter, uma
vez que eu sempre resolvia tudo.)
Depois de tudo terminado e reflexão de vida feita, percebi
que se permitir ser cuidada ao invés de cuidar de tudo poderia ser incrível, mas que para isso eu precisaria
abrir mão de ser sempre a Mulher Maravilha que faz tudo. Que não era coisa de ET receber uma gentileza
e que tem muito cara bacana por ai que tá louco pra ser parceiro nesse mundo
maluco que nós mesmas criamos. Para cuidar da gente, mesmo quando achamos que
não precisamos e que se danem as queimadoras de sutiãs!

Já passei por situações ridículas, tipo sentar no lugar ao
lado depois do rapaz ter puxado a cadeira pra mim por achar que ele estava fazendo isso
pra ele. Eu continuo podendo pagar o meu jantar, mas valorizo quem de vez em
quando se dispõe a ser gentil. Adoro organizar os eventos da galera, mas também adoro não ter que pensar em nada. Posso abrir o vinho, mas me derreto quando alguém
se dispõe a fazer isso por mim. Posso, de fato, fazer (quase) tudo sozinha, mas
descobri que poder dividir e delegar algumas coisas é sensacional.
Quando aprendi que posso me permitir tirar a capa, eu
aprendi também que posso ser eu mesma em todas as situações. Posso ser doce, carinhosa,
manhosa, engraçada, posso pedir colo, posso chorar e sorrir sem medo de parecer
ridícula. Não preciso ser um soldado ditando regras e não preciso acertar sempre. Posso conviver com as lâmpadas penduradas pelo
fio há 3 meses porque simplesmente eu ainda não decidi os lustres que quero
colocar, assim como posso me apaixonar por dois criados mudos. Aprendi que posso
confessar que odeio muitas opções e recentemente fui sabiamente corrigida e percebi
que eu não gosto mesmo é de ter que escolher algumas coisas, depois de ter que
fazer tantas outras escolhas durante o dia.
Sendo assim, pode me ajudar a escolher o almoço, a cor da parede, o
programa de amanhã, mesmo que ele seja ficar no sofá comendo pipoca. Pode rir de mim quando fico confusa diante de um cardápio de mais de duas páginas. Pode se irritar quando eu digo que "tanto faz" porque às vezes tanto faz mesmo: cinema, jantar com a galera ou vinho em casa. Pode me
ajudar a fazer tudo, sendo você meu parceiro, minha amiga ou
meu amigo. Eu não nego mais que preciso de ajuda de vez em quando. Muitas
vezes, não é fácil encontrar o caminho do meio... Mas eu garanto que a sensação é
libertadora!